Amor-perfeito
Sou verbo não conjugado
em forma infinitiva
com infinitas opções latentes:
no pretérito sou saudade
no futuro esperança
no presente, apenas sou.
Tenho a opção imperativa
de exigir definição,
mas na forma subjuntiva
sou hipótese, versão.
No real do indicativo
continuo indefinido...
se particípio ou gerúndio
se forma ou só ideia,
se participo de mundo
se continuo plateia.
Sou enfim um tempo simples
ansioso por me compor,
pois no composto sonho,
se isso possível for,
de verbo ser substantivo
de amar, tornar-me amor.
(POLETTO, J. Videventos. Curitiba: Juruá Editora, 2018, p. 33)
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Cela
A vida abriu uma janela
naquele lugar sem paisagem,
e ele olhava para dentro
no anseio de alguma miragem
que o portasse ao miolo
ajustado bem no centro
de todo o seu desconsolo.
Livro na mão
olhos fundos
pensamento além das grades
do cubículo imundo,
em absoluta solidão
sonhava com a liberdade.
(POLETTO, J. Poesia Turva. Rio de Janeiro: Ed. Saramago, 2019, p. 29)
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Soma
Conquanto
tenhamos pouco,
com tudo
não somos nada.
(POLETTO, J. Poesia Turva. Rio de Janeiro: Ed. Saramago, 2019, p. 51)
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Igualdade
Chegou ao hospital
com a farpa fisgando o olho,
sem plano de saúde
sem privada proteção.
Sofria de angústia pública
ali à espera, sem ação,
atado ao firme ferrolho
de sua própria condição.
Desejou não ter nascido,
mas vivo, em sofreguidão
ouviu na porta o vagido
da criança carregada
pelo pai desesperado
procurando solução.
O cartão do privilégio
segurava numa mão,
o filho acolhido na maca
médico de prontidão
atendendo com critério.
O da farpa foi ficando...
murchando olho e esperança.
Pra qual lado a balança
pende no caso sério?
Há cidadão de Bragança,
há outros só de miséria.
Pra que precisa de olho
se só enxerga desgraça?
Melhor não ver a cachaça
que engana seus sentidos,
o que ouve é o bastante,
o que disser, esquecido.
(POLETTO, J. Poesiaclara. Rio de Janeiro: Editora Saramago, 2020, p. 45)
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SOBRE O AUTOR
Juarez Poletto é escritor de longa data. Nos anos de 1980 a 1990, produziu quatro livros de ficção: No limiar da imaginação (Editar, 1986), O anjo fatal (HDV, 1987), Teia (HDV, 1988) e Corpo de marfim (HDV, 1989). Além disso participou de quatro antologias com poesias e contos: Voo de Vagalume (Positivo – 1981, 1982, 1983, 1985) Depois disso, ainda antes de 2000, dedicou-se mais à poesia e publicou quatro livros em edições do autor, em forma de brochuras: Alma nos dedos (1988); Diálogo (1991); Armazém (1995); Silhueta (1998). Já nos anos 2000, até o presente momento, foram seis obras: Vaidade (Milyarte, 2002). Adverso (Juruá, 2009), Fisionomia líquida (Juruá, 2015), Videventos (Juruá, 2018), Poesia turva (Saramago, 2019) e Poesiaclara (Saramago, 2020). Ainda em 2020 saiu pela Saramago o romance Fogo para flauta e violinos. Escreveu ainda Jabota e Jabuti (infantil – EDUTFPR, 2015), Entre a corda e o nó (romance–Juruá, 2010), Visões poéticas do mundo do trabalho (estudos literários – Juruá, 2011) e coordenou a publicação Literatura e experiência humana (EDUTFPR, 2016). Este ano (2021), publicou um novo romance pela EDUTFPR: Oportuno Acaso, editora pela qual republicou suas duas primeiras narrativas ficcionais. As obras publicadas pela EDUTFPR são e-book com acesso gratuito para o público em geral, no repositório da UTFPR (http://repositorio.utfpr.edu.br/jspui). Professor por 45 anos em instituições como PUC e UTFPR, agora aposentado se dedica a conferências e à produção literária.
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