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Foto do escritorRevista Trajanos

Estéril turbilhão e outros poemas, por Otto Leopoldo Winck



Estéril turbilhão


A vida podia ser um verso.

Não é. É o reverso: prosa rasa

onde raramente pinta uma pepita.

A vida podia ser um verbo:

ser, estar, haver. Não é.

A vida, substantivo abstrato,

é concreta. Pedra de toque? Pedra angular? Não, pedra bruta.

A vida, diabos, podia ser tanto: espanto, encanto, quebranto.

Um sonho? Teatro? Paraíso?

Nada disso: um soco

na cara. No saco. No útero. A vida

é um saco, um susto, um suco gástrico.

Não um verso. Pois é,

a vida podia ser um verso,

ainda que branco, sem metro (sem medo).

Não é. A vida é isso que é,

isso que temos pra hoje:

prosa rasa, prosa chocha, prosa escrota

mas que oculta em meio a suas frases

diamantes, esmeraldas e um rubi.

Sim, um rubi, que Bilac, pra não perder a rima,

grafou “rubim” e engastou num poema chato pra cachorro

que graças a Deus não é a vida.



---



Amarugem


Tal um conhaque

na manhã de névoa,

bebo meus versos.


Sei que a rua não vai dar em lugar algum

e que a saída do labirinto se chama nada.

Mas com um verso aqui, outro acolá,

vai-se dando um jeito.

E enquanto o Minotauro não dá as caras,

vai valendo o jogo.


(Por vias das dúvidas

carrego o óbolo

com que subornar Caronte.)


A vida é um livro aberto:

mas de versos

livres, com poucas, raras rimas

e muito espaço em branco

onde eu posso garatujar

teu rosto

e o desgosto de tudo ser tão breve

quanto um trago.


Tal um conhaque

ingiro meus versos

na manhã que se estende cinza

sobre a cidade.


É amarga, muito amarga

esta minha poesia.


---




Ponto final



Ninguém viu, ninguém, soube: mas sob a ponte o poeta escreveu ontem o seu último verso.


Ninguém viu, ninguém soube: com cacos, com latas, com lástimas – mas sem lágrimas – o poeta concluiu ontem sua obra.


Se ode ou epopeia ninguém sabe.


Só se sabe que é rubro o ponto final.





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