Éramos cinco, ou quase isso, mas naquele dia sentamos eu e a Edna, um em cada lado da sala. Na época, ela era professora da faculdade e eu, aluno do segundo ano do curso de Letras. Local e hora marcados para uma oficina de escrita: bloco D da UTFPR, terceiro andar, 19h. Havia alguns percalços, por conta do horário; porque era tudo combinado de boca em boca e porque o elevador ainda não estava pronto (e eram muitas as levas de escadas).
Esperávamos por Miguel Sanches Neto, que depois de vir para Curitiba para participar de uma banca de TCC e uma palestra, topara deixar de lado a pausa do café para conhecer aquele grupo de estudantes que só queria escrever. Não sei o quanto ele estava cansado, mas as levas de escadas não ajudariam muito. Chegaram ele e a Naira, também professora do curso. “Quando chegarão os outros?”, ela pergunta. Nem eu nem Edna sabíamos. Sanches Neto naquele dia entrou calado e saiu calado. O chá de cadeira foi grande, mas aprendemos com isso, professor Sanches Neto.
Nos desculpamos, é claro, imprevistos né. Se essas coisas acontecem? Nem sabíamos. Seis meses depois, entramos em uma sala com 44 pessoas, que esperavam por uma oficina de escrita do Otto Leopoldo Winck. Descobrimos que em um grupo fechado o sangue é menos quente. Anos depois, cada um tomou seu rumo e eu estou aqui, erguendo minha xícara de café em reverência e escrevendo este texto para festejar os quatro anos do Entreprosas, neste 21 de março, Dia Mundial da Poesia.
Sabe, para um grupo ser aberto os desafios são bem diferentes. Com o tempo, fomos tomando algumas cautelas para que o nosso ambiente de escrita fosse o mais equitativo possível em condições para o público e, enfim, aberto. Precisávamos ser independentes e não nos atrelar ao compromisso que uma instituição exige, na ideia de sermos mais voluntários e menos “organizados”. Afinal, você não precisa de contratos para conversar com seus amigos, por exemplo. Por consequência disso, acabamos por oferecer apenas oficinas gratuitas, ou o mais próximo disso possível (leia-se, baixo custo).
Assim, fomos para a rua e para a internet. A utilização de espaços públicos – praças, parques, faculdades, Facebook, Instagram “etecetera” – se tornaria outra meta, por se valer desses ambientes acessíveis e fora de qualquer zona de conforto. Dessa maneira, passamos a ser um grupo itinerante, uma espécie de ovelha desgarrada do universo palaciano e catedrático da escrita “curitiboca”.
Nossa ideia de qualidade é um pouco diferente, confesso. Sentar em praça pública não é lá muito confortável, mas, como escritores, buscamos a experiência. E nosso padrão de qualidade é essa experimentação máxima da escrita e da troca de vivências no universo da escrita. Sei que muitos não têm interesse em assinar como escritores, mas têm sim uma vontade, e por vezes um receio, em se aproximar desse “mundo”.
Já disse José Saramago: “somos todos escritores, só que alguns escrevem, outros não”. Entendo que o potencial da escrita é esse, o de medir e enxergar aquilo que podemos experienciar, por isso vamos cultivando esse espaço comum e quase anárquico de troca de experiências.
Não pudemos então limitar o trabalho às oficinas de escrita criativa. Publicamos um livro colaborativo, organizamos saraus e agora nosso novo passo é esta revista. Temos outros projetos, mas ainda há muito o que aprender.
Correndo o risco de a esta altura já ter ficado enfadonho, me despeço desejando, além do “clichêzão” de que tenhamos outros anos pela frente, que o Entreprosas inspire outros grupos a seguir também por essa estrada coletiva, pois vale a pena.
Sigamos.
João Simino
Coordenação e curadoria do Entreprosas (Grupo de Escrita)
https://www.facebook.com/entreprosass
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